A sociedade em conta de participação e o novo Código Civil

Por Joaquim Manhães Moreira
A Sociedade em Conta de Participação (“S”) é uma reunião de pessoas físicas ou jurídicas para a produção de um resultado comum, operando sob a responsabilidade integral de um “sócio ostensivo”. É o sócio ostensivo quem pratica todas as operações em nome da S, registrando-as contabilmente como se fossem suas, porém identificando-as para fins de partilha dos respectivos resultados.

Os sócios participantes (antigamente denominados ocultos), ou seja, todos os outros integrantes do empreendimento que não o sócio ostensivo, não têm participação na gestão dos negócios e se obrigam somente perante este último.

Até o ano de 1986 a S não era considerada contribuinte para fins de apuração dos lucros tributáveis pelo IR-PJ. Em dezembro daquele ano o Decreto-Lei 2303 ou a dispor de modo diverso.

Seguindo o referido Decreto-Lei os Regulamentos do Imposto de Renda que se seguiram, até o atual Decreto 3000 de 1999, aram a exigir que a S: (a) tenha registro próprio junto à SRF (CNPJ); (b) apure os seus resultados tributáveis separadamente daqueles obtidos no mesmo período pelo seu sócio ostensivo; e, (c) não compense os seus resultados positivos com os prejuízos fiscais do sócio ostensivo ou vice-versa e nem com os de outra S.

Essas restrições inicialmente aplicáveis à apuração do IR-PJ foram também estendidas ao cálculo da Contribuição Social Sobre o Lucro (CSSL).

O Novo Código Civil brasileiro, em vigor desde janeiro de 2003 deu nova regulamentação às Ss, classificando-as como sociedades não personificadas, ou seja, aquelas que não adquirem personalidade jurídica nem mesmo após o início das suas operações, não devendo ser registradas em qualquer órgão ou serventia, seja Junta Comercial, seja Cartório. O Código estabelece que mesmo que obtenha por qualquer modo esse registro a S ainda assim não adquirirá personalidade jurídica.

O presente artigo pretende demonstrar que essa nova regulamentação da S retira em definitivo da norma tributária a legitimidade para exigir a apuração dos resultados desse tipo de sociedade, em separado daqueles obtidos pelo seu sócio ostensivo. Como principal conseqüência dessa nova realidade jurídica não poderá o Fisco continuar impedindo a compensação de prejuízos fiscais do sócio ostensivo com os lucros da S ou vice-versa.

1. Conceitos de S no novo Código Civil em comparação com os dispositivos equivalentes do antigo Código Comercial

O novo Código Civil brasileiro (Lei 10406) regula as S nos seus artigos 991 a 996. Os referidos dispositivos compõem o Capítulo II do Subtítulo que enumera e regulamenta as sociedades não personificadas.

De acordo com o novo Código na S a atividade que constitui o objeto social é exercida pelo sócio ostensivo, e só por ele, em seu nome e sob sua própria e exclusiva responsabilidade. Os demais sócios apenas participam dos resultados gerados. (1)

Todas as obrigações perante terceiros, sejam fornecedores, clientes, empregados e outros, são assumidas apenas pelo sócio ostensivo, e a ele compete responder por elas. Os sócios participantes respondem apenas perante o sócio ostensivo pelas obrigações que assumir no respectivo contrato social. (2) É muito importante notar que o Código expressa a responsabilidade única do sócio ostensivo perante terceiros. Não faz qualquer restrição e nem qualifica quais sejam esses terceiros, não havendo, portanto, fundamentação para se excluir de tal rol as pessoas jurídicas de direito público, competentes para criar e arrecadar tributos.

A existência da S independe de qualquer formalidade e pode ser provada por todos os meios de direito, portanto, inclusive através de depoimento testemunhal ou confissão das partes. (3)

O artigo 993 estabelece importantes comandos normativos relativos a essa sociedade, quando se faz uma análise sob a perspectiva tributária, a saber: (1º) dispõe que o contrato social somente produz efeito entre os sócios, ou seja, inversamente, não pode produzir efeitos perante terceiros, nem mesmo perante o Fisco; (2º) a sociedade não possui personalidade jurídica e nem mesmo a sua eventual inscrição em qualquer órgão lhe conferirá tal atributo.

Além disso, é vedado ao sócio participante interferir nas relações com terceiros, atribuição privativa do sócio ostensivo, sob pena de com ele responder solidariamente pelas obrigações assumidas. (4)

Sendo uma sociedade é possível se constatar, através de perícia contábil, a individualização do patrimônio de uma S, ou seja, a sua especialização patrimonial. Mas o Código estabelece que essa especialização patrimonial somente produz efeitos em relação aos sócios. (5) Portanto, a especialização patrimonial da S não pode produzir efeitos perante quaisquer terceiros, nem mesmo perante o Fisco.

Por último o novo Código dispõe que a liquidação da S rege-se pelas normas relativas à prestação de contas, na forma da lei processual. (6) Se a S fosse detentora de personalidade jurídica sua liquidação se faria pelas normas aplicáveis à liquidação das sociedades.

Os parágrafos acima resumem os dispositivos do novo Código Civil de interesse tributário. Anteriormente a matéria encontrava-se regulada pelos artigos 325 a 328 do Código Comercial (7).

Os dispositivos revogados do Código Comercial traçavam um contorno relativamente vago da S, e em relação à personalidade jurídica limitavam-se a estabelecer que ela não estava sujeita às mesmas formalidades das demais sociedades, e poderia provar-se por todo o gênero de provas itidas para os contratos comerciais, o que incluía aquelas decorrentes dos usos e costumes.

Mas tanto no Código Comercial antigo como no atual Código Civil fica claro para o intérprete a natureza meramente contratual e não societária da S. Ela é uma forma jurídica colocada à disposição de empresários para a exploração de determinadas atividades em que faça sentido econômico apenas um deles se obrigar perante o mercado. Mas na sua essência a S sempre obrigou e gerou efeitos apenas para as partes que a constituem, não podendo ser tratada como ente dotado de personalidade jurídica para nenhum fim de direito.

O novo Código Civil operou uma inovação na regulamentação da S enquanto instituto de direito privado, por tê-la classificado expressamente como sociedade destituída de personalidade jurídica, e como tal definindo a sua essência, funcionamento e capacidade de se obrigar perante terceiros, e, por conseqüência também perante o Fisco, estabelecendo sempre como seu único operador e responsável o sócio ostensivo.

2. A legislação tributária aplicável às S

De início é importante não esquecer que todas as normas tributárias, assim como as decisões jurisprudenciais fiscais a respeito da S foram erigidas sob o amparo das leis que até o dia 10/01/03 regulamentavam esse instituto de direito privado.

A atribuição de personalidade jurídica às S para fins tributários tem como fundamento legal o artigo 7º do Decreto-Lei 2.303 de 21/11/1986. Em resumo aquele dispositivo estabeleceu que (a) as sociedades em conta de participação ficavam equiparadas às pessoas jurídicas para os efeitos da legislação do imposto sobre a renda; e, (b) na apuração dos respectivos resultados, assim como na tributação sobre os lucros deveriam observar as normas aplicáveis às demais sociedades.

Como conseqüência direta do acima exposto a SRF ou a exigir o registro das S no CNPJ, como se fossem pessoas jurídicas.

O atual Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR) dispõe sobre a aplicação do referido texto legal em três dos seus dispositivos abaixo comentados.

Em primeiro lugar repete o conceito de que as S são equiparadas às demais pessoas jurídicas tributáveis pelo imposto (art. 148).

O RIR estabelece também, em seu artigo 254, que a escrituração contábil das operações da S pode ser feita na própria contabilidade do sócio ostensivo, ou, à opção deste em livros próprios, observando-se que os resultados da S deverão ser demonstrados separadamente daqueles pertencentes ao sócio ostensivo.

E no artigo 515, caput e parágrafo único, veda completamente a compensação de prejuízos e lucros entre a S e seu sócio ostensivo e entre aquela e outra sociedade do mesmo gênero.

Portanto, a legislação do IR-PJ e da CSSL confere à S o atributo de sujeito ivo, cuja existência no mundo jurídico independe da do seu sócio ostensivo, porém, exclusivamente para o cálculo de tais tributos.

Pode-se perceber que a legislação tributária e a respectiva regulamentação aqui citadas aproveitavam-se de uma falta de explicitação da natureza jurídica desse tipo societário, um defeito da antiga norma de direito privado sobre a matéria. Em face da inexistência de declaração expressa no sentido de que a S não dispunha de personalidade jurídica, a legislação tributária trilhava o caminho mais lucrativo para os cofres públicos.

3. A jurisprudência istrativa

As decisões dos órgãos istrativos de primeira e segunda instância têm sido coerentes com a interpretação constante do RIR, reconhecendo para fins tributários a personalidade jurídica das S.

No nível de primeira instância istrativa a DRF de Julgamentos SP I, por sua 4ª Turma, decidiu em 10/04/2003 que o resultado e o lucro real correspondente à S deverá ser apurado e demonstrado destacadamente do resultado e do lucro real do sócio ostensivo. No mesmo acórdão decidiu ainda que não é permitida a exclusão do lucro inflacionário da S do lucro líquido da sócia ostensiva, no cálculo do lucro real. (8)

Já no nível de segunda instância istrativa merece citação a decisão do 1º Conselho de Contribuintes, 8ª Câmara, de 17/08/2000, em termos equivalentes àquela acima citada, ou seja, reconhecendo que compete ao sócio ostensivo a apuração dos resultados, a apresentação da declaração de rendimentos (em separado da sua) e o recolhimento dos tributos relativos à S. (9)

Diversas outras decisões tanto de primeira quanto de segunda instâncias istrativas corroboram o entendimento do Fisco, no sentido de que a S deva ser tratada como um sujeito ivo individual, cuja existência no mundo do Direito Tributário independente da do seu respectivo sócio ostensivo.

Todas as decisões pesquisadas expressam, entretanto, as obrigações do sócio ostensivo em relação à S de promover o registro de suas operações de forma individualizada, ou seja, que possa gerar identificação precisa. Afirmam também a responsabilidade do sócio ostensivo por apresentar a declaração de rendimentos da S e efetuar o pagamento dos tributos.

4. A jurisprudência dos Tribunais

Os Tribunais têm tido a oportunidade de apreciar as S sob diversos aspectos, principalmente os não tributários. Todavia mesmo dessas decisões é possível extrair conceitos relevantes para o universo fiscal.

O Superior Tribunal de Justiça decidiu no Recurso Especial 474404-PR que “não há falar em citação de sociedade em conta de participação que não tem personalidade jurídica e nem existência perante terceiros.” (10)Naquele julgado, mesmo antes do advento do novo Código Civil, o STJ deixou clara a sua posição no sentido de que a sociedade em conta de participação não possui personalidade jurídica.

O mesmo STJ decidiu no Recurso Especial 168028, que na S é somente o sócio ostensivo que se obriga perante terceiros por todas as obrigações e operações sociais. Essa responsabilidade nunca pode ser atribuída ao sócio participante, que sequer é conhecido daqueles com os quais a sociedade contrata. (11) Mais uma vez aqui o Tribunal afasta a existência legal da S perante terceiros, reconhecendo que é somente o sócio ostensivo que em seu nome concretiza as operações comerciais.

Ainda o STJ decidiu também no Agravo Regimental de Agravo de Instrumento 353976, ao apreciar matéria em que havia pretensão de sócio participante em relação a sócio ostensivo, que se tratava de ilícito contratual (e, como conseqüência não societário). (12) Reconheceu assim a natureza estritamente contratual da S, vinculando e gerando efeito apenas, por conseqüência, para as partes de tal contrato.

No nível dos TRFs é imprescindível a citação da decisão do TRF-4 em um julgado de 17/06/97(13), que teve como seu relator o atual Ministro do STJ Gilson Dipp: “A sociedade em conta de participação não tem capacidade tributária iva. Pretensão repetitória não acolhida por falta de prova de recolhimento indevido. As disposições dos ART-10, INC-1 e INC-2, do DEL-1598 /77 E ART-280 DO RIR-80, atentam contra o ART-43 do CTN-66, na medida em que fazem presumir disponibilidade patrimonial”.

Nesse último julgado o TRF-4 reconheceu a inexistência da capacidade tributária iva da S. Esse é um conceito importante, pois não se limitou a reconhecer a inexistência da personalidade jurídica, mas, em conseqüência da falta desse atributo definiu a não existência da capacidade tributária iva.

Apesar de todas essas decisões reconhecendo a essência da S como um contrato que vincula apenas as referidas partes, e, portanto, impossibilitada de se qualificar como sujeito ivo da obrigação tributária, o próprio STJ equivocou-se com a legislação anteriormente vigente.

De fato, no julgamento do Recurso Especial 193.690, (14) itiu que a partir da vigência do Decreto-Lei 2303 a União Federal tinha competência para considerar a S detentora de capacidade tributária iva, mas que não poderia fazê-lo antes do início da vigência da referida norma.

Em resumo a jurisprudência do STJ e do TRF-4, ao contrário da istrativa, tem aceitado o conceito de que a S não possui personalidade jurídica e que somente o seu sócio ostensivo adquire direitos e em seu nome contrai obrigações. Um julgado isolado, anterior ao novo Código Civil, equivocadamente aceitou a possibilidade do reconhecimento da capacidade tributária iva, mesmo na ausência da personalidade jurídica. Tal decisão, entretanto, é importante frisar, é anterior à regulamentação atual da matéria pelo Direito Privado.

5. A norma de integração dos institutos de Direito Privado ao Direito Tributário

A norma de integração dos institutos de Direito Privado ao Direito Tributário é o artigo 110 do Código Tributário Nacional. De acordo com esse dispositivo a norma tributária está impedida de alterar a definição, o conteúdo e o alcance tanto dos institutos como dos conceitos e formas de direito privado.

O artigo 110 do CTN refere-se à proibição acima para institutos, conceitos e formas usados expressa ou implicitamente pelas Constituições Federal, dos Estados e pelas Leis Orgânicas dos Municípios.

Uma vez que o Código Civil regulamenta as relações entre pessoas físicas e jurídicas sob o amparo da Constituição Federal, os conteúdos e conceitos dos seus institutos e formas são exatamente aqueles referidos implicitamente pela Lei Maior, e, portanto, impossibilitados de sofrerem alteração pela norma tributária.

Ensina a mais culta doutrina que para o Direito Tributário todo ato é um fato. Realmente, atentaria contra os princípios constitucionais da legalidade e da tipicidade permitir que a norma tributária pudesse de per si modificar a definição e o conteúdo dos institutos de Direito Privado.

Só para se ter idéia do absurdo a que tal permissão conduziria, basta imaginar como exemplo uma norma tributária que estabelecesse que para fins de tributação toda operação de empréstimo, sob a forma de financiamento feito por uma instituição do Sistema Financeiro Nacional seria considerada uma operação relativa à circulação de mercadorias, sujeita ao ICMS.

De fato, tanto o princípio da estrita legalidade como o da tipicidade impedem a norma tributária de englobar no campo de incidência dos tributos outros fatos ou operações que não tenham a natureza jurídica definida pelo Direito Privado, expressa nas regras que exprimem a materialidade de cada exação.

A S é um contrato comercial pelo qual se estabelece uma sociedade peculiar, desprovida de personalidade jurídica e que só opera no mundo das relações exteriores àquelas mantidas entre os sócios, através da atuação do sócio ostensivo. Tal é o instituto de Direito Privado, que não pode ser modificado pela legislação fiscal.

6. O sujeito ivo da obrigação tributária na S

O artigo 121 do CTN estabelece que o sujeito ivo da obrigação tributária é a pessoa obrigada ao pagamento do tributo. Pessoa é um conceito de Direito Civil. Há a pessoa natural (15) e há a pessoa jurídica(16).

O Código Civil enuncia a existência de três espécies de pessoas jurídicas de Direito Privado: as sociedades, as associações e as fundações. As sociedades são regulamentadas nos artigos 981 a 1195 da nova codificação.

Como já explicado no início deste trabalho a S figura dentre aquelas sociedades desprovidas de personalidade jurídica, impedidas de obterem tal qualificação em todas as circunstâncias. A S não é uma pessoa nem física e nem jurídica, faltando-lhe, portanto, um requisito essencial para se transformar em sujeito ivo de qualquer obrigação tributária.

Uma vez que na S é o sócio ostensivo que realiza as operações, que obtêm lucro ou arca com prejuízo e que é o único com legitimidade para adquirir direitos e contrair obrigações, não há como negar ser ele a única pessoa (física ou jurídica) que poderá ser escolhido pela norma tributária como sujeito ivo das obrigações principais e órias.

Aliás, quando se analisa o RIR (dispositivos já citados) observa-se que o sócio ostensivo já é o sujeito ivo das obrigações órias, uma vez que a ele compete registrar as operações, apurar os resultados da S e apresentar a respectiva declaração de rendimentos.

O Decreto-Lei 2303 operou uma “equiparação” que já não tinha base constitucional na legislação anterior ao atual Código Civil, pois mesmo naquela época a S não era registrada em nenhum órgão competente para conferir personalidade jurídica. Tal equiparação tornou-se ainda mais inconstitucional, por violar os princípios da tipicidade e da estrita legalidade, com o advento da nova codificação.

7. Prejuízos fiscais e bases negativas íveis de compensação

Levando-se em conta que para o mundo exterior ao das relações entre os sócios a S não existe, e que é o próprio sócio ostensivo quem pratica todas as operações, adquire direitos e contrai obrigações, é possível afirmar que os prejuízos fiscais (relativos ao IR-PJ) e as bases negativas (relativas à CSSL) apuradas pelo sócio ostensivo podem perfeitamente ser compensadas com os lucros da S através da consolidação obrigatória.

Devemos lembrar sempre que não se trata de itir compensação entre pessoas jurídicas diferentes, mas sim de permitir que a pessoa jurídica do sócio ostensivo calcule o IR-PJ e a CSSL englobando em sua apuração a totalidade das operações que praticar com o mundo exterior. E isso sem prejuízo dos seus deveres para com os sócios participantes. Portanto, não se trata de compensação propriamente dita, mas sim de mera consolidação global de operações e resultados do sócio ostensivo.

Na prática a apuração do IR-PJ e da CSSL da S pelo sócio ostensivo, muito se assemelha à apuração de resultados contábeis das grandes corporações. Perante terceiros demonstra-se um resultado global, embora internamente as diversas divisões de negócios possam compensar entre si os seus resultados positivos e negativos, uma vez que integram uma mesma pessoa jurídica.

Da mesma forma os prejuízos e bases negativas apuradas pela S devem ser também consolidadas com os resultados do sócio ostensivo.

Finalmente, se o mesmo sócio ostensivo contratar mais de uma S os resultados de todas devem ser consolidados com os dele. A importância da compensação dos resultados da S com os do sócio ostensivo crescerá ainda mais quando o STF decidir em definitivo e levando em conta o conceito de renda, a questão da impossibilidade da lei tributária limitar em 30% a compensação de prejuízos.

8. Conclusões

(1ª) O novo Código Civil estabeleceu novos conceitos para o instituto da S e ou a expressar que ela não tem e não pode adquirir personalidade jurídica em nenhuma circunstância. Ela opera e se obriga perante terceiros através do seu sócio ostensivo, exclusivamente.

(2ª) A equiparação da S a pessoa jurídica para fins fiscais tinha como fundamento o Decreto-Lei 2303 de 1986, o qual aproveitou-se da omissão do antigo Código Comercial quanto à personalidade jurídica desse tipo de contrato societário, para lhe atribuir a condição de sujeito ivo da obrigação tributária.

(3ª) A jurisprudência istrativa anterior ao novo Código prestigiou plenamente o conceito do Decreto-Lei 2303. Já a jurisprudência dos Tribunais, em sua maioria já aceitava a idéia da inexistência da personalidade jurídica das S.

(4ª) O novo Código Civil modificou o conceito do instituto ando a classificar expressamente a S como sociedade não personificada, e, portanto, revogou tacitamente o Decreto-Lei 2303, por força do disposto no § 1º do artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil,(17) por incompatibilidade entre suas disposições.

(5ª) O CTN exige em seu artigo 121 que o sujeito ivo da obrigação tributária seja uma pessoa. A S não é pessoa, nos termos do novo Código Civil, não podendo, portanto, receber o encargo da sujeição iva. A única pessoa que pode assumir tal função é o sócio ostensivo, pelas razões acima expostas.

(6ª) O direito do sócio ostensivo de compensar os seus resultados com os da S decorrem da sua obrigação de consolidar para todos os fins de Direito Privado as suas operações, o que engloba também aquelas realizadas por força do referido contrato societário.

(7ª) Assim sendo, após o advento do novo Código Civil pode o sócio ostensivo considerar como sendo seus os resultados da S e, assim, gerar os efeitos econômicos de: compensação dos seus prejuízos fiscais e bases negativas com lucros da S; ou, compensação dos seus lucros com os prejuízos e bases negativas da S; ou, ainda, para aqueles que mantêm mais de uma S, consolidar os resultados fiscais de todas nos livros do sócio ostensivo.

(8ª) Em que pese a fundamentação legal para as conclusões acima o Fisco ainda mantém a sua idéia anterior, de considerar a S “personificada” somente para fins fiscais, como demonstra a jurisprudência istrativa citada no presente trabalho.

(8ª) O contribuinte que deseje fazer valer o seu direito de compensação, poderá deduzir a sua pretensão istrativamente, através de consulta, com base nos fundamentos aqui formulados, entre outros, ou recorrer ao Poder Judiciário.

Notas de rodapé

1- Novo Código Civil art. 991, caput.

2- Idem art. 991, § único.

3- Idem art. 992.

4- Código Civil, art. 993, § único.

5- Código Civil, art. 994 caput e § 1º.

6- Idem, art. 996.

7- Lei 556 de 25 de junho de 1850.

8- DRF-J-I Acórdão 3126 de 10/04/03, obtido no site www.receita.fazenda.gov.br, pela pesquisa de citações de S.

9- 1º CC, 8ª Câmara, Processo 10650.000874/94-19, Acórdão 108-06207 de 17/08/2000, obtido no site www.receita.fazenda.gov.br, pela pesquisa de citações de S.

10- STJ. Resp. citado Recurso Especial 2002/0136550-3,DJ 10/03/2003 PG:00213, obtida em www.stj.gov.br pela pesquisa de jurisprudência com citação de S.

11- STJ.Resp. citado, processo 199800199470, 4ª Turma, DJ 22/10/2001 página:326, obtida em www.stj.gov.br pela pesquisa de jurisprudência com citação de S.

12- STJ. Agravo citado, processo 200001363956, 3ª Turma, DJ 07/05/2001 página:142, obtida em www.stj.gov.br pela pesquisa de jurisprudência com citação de S.

13- TRF-4. Apelação Cível 9104041917-PR; 1ª Turma; DJ 13/08/1997 PÁGINA: 62845, obtida em www.cjf.gov.br, pela pesquisa de jurisprudência com citação de S.

14- STJ. RESP 193690 / PR ; RECURSO ESPECIAL 1998/0080766-7; DJ ATA:07/10/2002 PG:00210 obtida em www.stj.gov.br pela pesquisa de jurisprudência com citação de S.

15- Código Civil, artigos 1º a 39.

16- Código Civil, artigos 40 a 69.

17- Art. 2º, § 1º: A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.”

Joaquim Manhães Moreira é advogado em São Paulo e sócio fundador da Manhães Moreira Advogados Associados.

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